Duas novas espécies de peixe do gênero Neoplecostomus, conhecidos popularmente como cascudos, foram recentemente descritas em um estudo realizado por biólogos da Universidade Federal de Lavras (UFLA) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp).
A descoberta, publicada na revista Neotropical Ichthyology, ocorreu nas cabeceiras do Rio Sapucaí, um afluente do Rio Grande, que integra a bacia do alto Paraná, na região montanhosa da Serra da Mantiqueira, localizada entre os estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. As novas espécies são endêmicas da região, ou seja, não podem ser encontradas em nenhum outro lugar do mundo.
Foto: Pedro Uzeda.
O estudo revela que as duas espécies de cascudos compartilham um ambiente comum de alta altitude, mas se diferenciam por características físicas e comportamentais bastante distintas.
O Neoplecostomus altimontanus, a primeira espécie descrita, possui um corpo mais discreto, com manchas escuras bem definidas e uma nadadeira adiposa (uma espécie de barbatana) maior, adaptada para se camuflar em riachos de montanha mais sombreados.
Já o Neoplecostomus sapucaiexibe um padrão de cores mais vívidas, com barras claras ao longo do corpo, e sua nadadeira adiposa é menor ou até ausente, adaptando-se melhor a ambientes de riachos mais ensolarados e com menor vegetação.
Um fato curioso é que essas espécies possuem dimorfismo sexual dentário, uma característica rara entre os peixes. Nos machos, os dentes são grandes e grossos, enquanto as fêmeas apresentam dentes mais finos e delicados, um fenômeno que pode estar relacionado a diferentes hábitos alimentares entre os sexos.
Foto: Pedro Uzeda.
Além disso, os pesquisadores observaram uma redução nas placas ósseas laterais dos peixes, o que confere uma textura mais lisa ao corpo das novas espécies, algo inusitado para o gênero Neoplecostomus, cujos membros geralmente apresentam uma superfície mais áspera e revestida de placas duras.
A bacia do alto Paraná, onde as espécies foram encontradas, é uma das mais ricas em diversidade de cascudos, com 12 das 20 espécies conhecidas do gênero Neoplecostomus sendo localizadas nessa região. Esse fato evidencia a grande biodiversidade de peixes de água doce da América do Sul, que já conta com mais de mil espécies descritas, sendo a maioria delas de pequenas dimensões e distribuídas em áreas geográficas restritas, como é o caso dos cascudos da Serra da Mantiqueira.
Foto: Pedro Uzeda.
É importante lembrar que a região da Serra da Mantiqueira, onde essas espécies habitam, enfrenta sérias ameaças ambientais, como o desmatamento e a mudança climática. As altas altitudes em que os peixes vivem (entre 1.000 e 1.500 metros) os tornam particularmente sensíveis ao aquecimento global.
Alterações nas temperaturas podem prejudicar seus habitats naturais e comprometer a sobrevivência das espécies. A remoção da vegetação ciliar, que garante a estabilidade dos rios, também é uma grande preocupação. A destruição dessa vegetação pode levar ao assoreamento dos rios, preenchendo os espaços entre as pedras do fundo com areia, onde os cascudos se refugiam.
Com o aumento das temperaturas globais, esses peixes de montanha, que estão adaptados a climas frios e específicos, podem se ver em sérios riscos de extinção.
A descoberta dessas novas espécies reforça a necessidade de maior monitoramento e ações de conservação para garantir que a biodiversidade da região da Serra da Mantiqueira seja preservada.
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