Animais
resgatados dos incêndios no Pantanal começaram a ser tratados com pele de
tilápia. A técnica, descoberta por um grupo de pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC), consiste em usar o couro do peixe para acelerar a
cicatrização de queimaduras. Pela primeira vez, o método está sendo testado em
bichos silvestres.
No início
de outubro, parte do grupo viajou a Cuiabá para ensinar o procedimento aos
profissionais que atuam no Hospital Veterinário da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT). O hospital tem recebido e tratado casos graves de animais
feridos por conta das queimadas que atingem o bioma pantaneiro.
“É um curativo muito
rico em colágeno, e esse colágeno vai se incorporando ao corpo do animal
durante a cicatrização. A pele da tilápia é impermeável, o que evita que o
animal perca líquido e cria uma barreira física contra a entrada de
microorganismos na lesão”, detalha o biólogo Felipe Rocha, professor integrante
do grupo de estudos da UFC, que coordenou a equipe durante a missão.
A viagem foi viabilizada a partir
de um contato feito com a ONG Ampara Silvestre, que há dois meses atua no
Pantanal. “Muitos focos de incêndio, muitos animais morrendo queimados,
desorientados, procurando comida”, conta a vice-presidente da ONG, Marcele
Becker. “O projeto nos foi apresentado e toda ajuda é bem-vinda”, acrescenta.
Em Cuiabá, os pesquisadores aplicaram curativos com pele de tilápia em um veado-catingueiro, duas antas adultas, uma anta filhote, um tamanduá-bandeira e uma cobra-sucuri. No total, 130 unidades, de 13cm x 20cm cada, foram doadas à UFMT. O objetivo é facilitar o trabalho dos veterinários. “O tratamento convencional de queimaduras é com pomadas. O problema é que todo dia tem que fazer um curativo. Na pele da tilápia, coloca-se o curativo, e você só vai trocar quando o colágeno for absorvido, vai durar de 10 a 12 dias”, compara o biólogo.
Esse novo tipo de tratamento é
resultado de uma pesquisa que vem sendo desenvolvida desde 2015 pela
universidade cearense. Nos últimos anos, ele foi amplamente testado em humanos
e animais domésticos. Recentemente, o material foi enviado ao Líbano para tratar vítimas da explosão em Beirute. O produto, no entanto, ainda é
considerado experimental, por não possuir registro junto à Anvisa.
Biomaterial vem da piscicultura
A piscicultura vem ganhando força
no país a cada ano. Dados divulgados na última semana pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam um avanço de 1,7% na criação de
peixes em cativeiro em 2019: mais de 500 mil toneladas foram produzidas.
E é da piscicultura que vem a pele
da tilápia utilizada para pesquisa. O biomaterial é doado por uma empresa do
Ceará que comercializa filés dessa espécie de peixe. Na universidade, a pele,
descartada pela indústria, é aproveitada. “Fazemos a descontaminação, mantendo
as propriedades biológicas do material”, explica o biólogo Felipe.
De acordo com a Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR), o Brasil é o quarto maior produtor
mundial de tilápia, espécie que representa quase 60% da produção do país. Para o presidente
da Peixe BR,
Francisco Medeiros, o setor só tem a ganhar com a ação capitaneada pela
universidade do Ceará, que traz avanços importantes. “A piscicultura, que tem
um compromisso com a alimentação das pessoas, com um alimento de boa qualidade,
agora também oferece um produto de baixo custo, de excelente resultado, não só
para humanos, mas para animais silvestres, demonstrando que é sustentável a
produção de tilápias no Brasil”, destaca.
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